Gonadotrofinas e Testosterona
Tratamento da infertilidade no homem com hipogonadismo ( Testosterona baixa e LH baixo )
Endocrinologista e Metabologista pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP-SP). Autora do livro “O Essencial em Endocrinologia”.
Especialista em Endocrinologia e Metabologia pelo Hospital das Clínicas - FMUSP e Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia
Hipogonadismo hipogonadotrófico
O paciente com infertilidade por hipogonadismo hipogonadotrófico costuma ter bom prognóstico quando tratado adequadamente.
A hiperprolactinemia é uma causa frequente de hipogonadismo hipogonadotrófico, devido à inibição do eixo reprodutivo pela prolactina. Entre as causas mais freqüentes estão os prolactinomas (micro se menores que 1 cm e macro se maiores de 1 cm), farmacológicas, e funcionais (exemplo hipotireoidismo). O tratamento adequado é tratar a causa de base, isto é, reduzir os níveis de prolactina. Nos prolactinomas (micro ou macros), o tratamento inicial se dá com agonistas dopaminérgicos, que reduzem os níveis de prolactina, e consequentemente levam ao restabelecimento do eixo HHT (a resposta terapêutica depende de vários fatores e procedimentos cirúrgicos não estão descartados; uma revisão compreensiva sobre o tratamento de prolactinomas está além dos objetivos deste capítulo). A cabergolina é atualmente a droga de primeira escolha, por ter melhor índice de resposta, menos efeitos colaterais, melhor aceitação e melhor posologia. Geralmente, o uso de 1 comprimido de 0,5 mg de cabergolina por semana costuma ser o suficiente para a normalização da prolactina na maioria dos casos. Raramente, doses maiores como até 3,5 mg/semana podem ser necessárias para normalização dos níveis séricos da prolactina e redução do volume do prolactinoma. Os efeitos colaterais mais comuns dos agonistas dopaminérgicos são náuseas, vômitos, tontura, hipotensão postural, síncope, cefaleia e congestão nasal. Nos casos de resistência aos agonistas dopaminérgicos (que podem acontecer em 10% dos casos de prolactinomas), de intolerância aos medicamentos, ou de sintomas compressivos por macroprolactinomas que não reduziram de tamanho após o início do tratamento medicamentoso, o tratamento cirúrgico do prolactinoma estará indicado. Existem situações em que o eixo HHT pode não se restabelecer completamente após hiperprolactinemia crônica. Nesse caso, tratamentos adjuvantes estão sendo estudados na literatura, mas de maneira geral, se parecerão com o tratamento do hipogonadismo hipogonadotrófico idiopático ou genético, que será discutido a seguir.
Se o hipogonadismo for causado por alguma doença tratável ou por algum fator desencadeante que seja possivelmente retirado (como abuso de álcool, drogas como maconha, opióides, corticoides, dentre outros), deve-se tratar a doença de base e retirar o fator agressor, para que haja a reversibilidade do quadro.
Nos casos de hipogonadismo hipogonadotrófico de causa idiopática, genética (como na síndrome de Kallmann), por lesões estruturais de região hipotálamo-hipofisária (por tumores, cirurgias, irradiação, doenças infecciosas ou infiltrativas, etc.) ou por bloqueio do eixo HHT por uso prévio de esteróides androgênicos anabolizantes, um tratamento específico para a infertilidade deve ser iniciado.
hCG - Gonadotrofina Coriônica Humana
O hCG é uma molécula muito parecida com o LH. Ambos compartilham da mesma subunidade alfa, e se diferenciam por pequenas mudanças entre suas subunidades beta. O hCG é capaz de se ligar e estimular os receptores de LH das células de Leydig, funcionando como um análogo de LH. O uso de hCG é comprovadamente eficaz na maioria dos casos em elevar a produção intratesticular de testosterona no paciente que não tem disfunção primária nas suas células de Leydig. E, muitas vezes, é capaz de reestabelecer a espermatogênese sem necessidade de outras medicações adicionais.
Diversos protocolos têm sido realizados nos serviços que tratam de infertilidade masculina, visando encontrar qual a melhor dosagem e posologia do hCG para esta finalidade.
Revisando a literatura, encontramos protocolos com injeções subcutâneas ou intramusculares de hCG, desde doses de 500 UI até 3.000 UI de hCG, de 2x por semana até aplicação em dias alternados.
Recomendamos que se inicie com doses menores como 1.000 UI a cada dois dias, aumentando a dose em 50% a cada 1-2 meses caso não haja normalização dos níveis séricos de testosterona com a dosagem utilizada. O uso do hCG pode trazer aumento do risco de eventos tromboembólicos, além de ginecomastia, acne, dor testicular, retenção hídrica, cefaléia, depressão, irritação e reações cutâneas nos locais de aplicação (eritema, dor e reações alérgicas).
Caso o paciente permaneça em azoospermia e infertilidade mesmo após 6 meses de tratamento com hCG isolado
FSH Recombinante
O FSH recombinante demonstrou bons resultados quando aplicado em doses médias de 75 a 150 UI 3x por semana. Apesar de a maioria dos casos de hipogonadismo hipogonadotrófico obter resultados satisfatórios com o uso de FSH recombinante associado ao hCG dentro dos primeiros 4 meses de tratamento, pode ser necessário um tratamento longo, de até 18 meses, para se alcançar a fertilidade. Nestes casos, pode-se aumentar a dose do FSH recombinante para 225 UI 3xsemana caso o paciente mantenha-se azoospérmico mesmo após 6 meses de tratamento, ou para 300 UI 3x por semana, caso a azoospermia permaneça mesmo após 1 ano de tratamento. Trata-se de medicação geralmente muito segura e eficaz, mas que ocasionalmente pode cursar com efeitos colaterais como cefaléia, acne, ginecomastia, varicocele, ganho ponderal, sintomas flu-like, reações cutâneas no local de aplicação e discreto aumento do no risco de eventos tromboembólicos.
Um dado interessante que os estudos têm mostrado é que homens com hipogonadismo hipogonadotrófico não precisam atingir um espermograma com contagem normal de espermatozoides para conseguirem atingir fertilidade. Muitos estudos mostraram pacientes que atingiram fertilidade com contagem bem baixas, como apenas 1 a 1,5 milhões de espermatozoides por ml. Cerca de 90% dos pacientes com hipogonadismo hipogonadotrófico conseguem alcançar pelo menos 1 milhão de espermatozóides/ml no espermograma após 1 ano de tratamento com hCG e FSH recombinante, quando se excluem pacientes com antecedente de criptorquidia ou com qualquer outro fator de risco para lesão testicular primária prévia. Caso o paciente não obtenha fertilidade mesmo depois de 20 meses em tratamento combinado com hCG associado ao LH, ou após 8 meses já tendo atingido uma contagem de pelo menos 5 milhões de espermatozóides/ml, no espermograma, deve-se indicar o uso de técnicas de reprodução assistida, conforme detalhado mais à frente neste capítulo.
Uma outra possibilidade terapêutica para o tratamento da infertilidade causada por hipogonadismo hipogonadotrófico de causa hipotalâmica é o tratamento com a infusão subcutânea pulsátil de GnRH, feita através de uma bomba de infusão contínua, de alto custo, geralmente disponível apenas em centros de referência e hospitais terciários. A bomba fica pré programada para infundir doses pulsáteis de 100 a 400 ng/kg de GnRH a cada 90 a 120 minutos no tecido subcutâneo da parede abdominal do paciente. Devido ao seu alto custo, inconveniência, pouca disponibilidade e falta de resposta nos casos em que o hipogonadismo é causado por doença hipofisária, este tipo de tratamento é atualmente pouco realizado.
Citrato de Clomifeno
O citrato de clomifeno é um modulador seletivo do receptor estrogênico (SERM), que se liga aos receptores de estrogênio sem estimulá-los, funcionando como um antagonista destes receptores. Desta forma, inibe a retroalimentação negativa que o estrogênio exerce sobre as células hipotalâmicas e hipofisárias e, com isso, ativa uma maior produção de GnRH e de gonadotrofinas endogenamente.
Recomendamos doses como 25 mg diários ou 50 mg em dias alternados costumam ser suficientes para estimular uma maior produção de testosterona intratesticular e, consequentemente, de espermatozoides, em pacientes que ainda possuem uma reserva hipotálamo-hipofisária parcial. Seu uso pode ser isolado ou associado a outras técnicas como o hCG.
O estímulo gonadotrófico com clomifeno é especialmente útil nos casos de hipogonadismo hipogonadotrófico funcional, sem lesão anatômica ou estrutural hipotálamo-hipofisária, como acontece por exemplo nos casos de pacientes com hipogonadismo por obesidade e síndrome metabólica, que costumam responder muito bem a este tipo de tratamento, por possuírem níveis de estradiol elevado, que suprime fortemente o eixo HHT, ou mesmo nos casos de hiperprolactinemia em que o eixo não se reestabelece adequadamente após redução dos níveis de prolactina. No entanto, ainda faltam estudos que garantam a segurança do seu uso a longo prazo, de forma que sua utilização com esta finalidade ainda é considerada off-label.
Inibidores da Aromatase
O uso de inibidores de aromatase também pode ser útil para o tratamento do hipogonadismo hipogonadotrófico causado pelo hiperestrogenismo. Efeitos indesejados, porém, como a perda de massa óssea fazem com que este tipo de tratamento não seja seguro para ser utilizado a longo prazo.
Pacientes com hipogonadismo hipogonadotrófico que desejam preservar a fertilidade futura, mas que não estejam procurando tratamento para fertilidade no momento, uma boa opção de tratamento seria a associação da terapia androgênica clássica com doses baixas de hCG subcutânea ou intramuscular. Hsieh e Cols demonstraram preservação da espermatogênese em homens hipogonádicos que recebiam 500 UI de hCG subcutâneo em dias alternados, associados à terapia clássica com testosterona tópica ou intramuscular, quando comparava-se o espermograma basal do paciente com novo espermograma colhido após 1 ano de tratamento. Outros estudos mostraram que doses menores como 250 UI a cada 2 dias já eram capazes de manter os níveis de testosterona intratesticular dentro da faixa da normalidade enquanto os pacientes eram submetidos à terapia androgênica clássica.
Dr. Conrado Alvarenga
Membro da Divisão de Urologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP